Acordei cedo para fazer o exame periódico. Cheguei ao local. Esperei um pouco e o médico apareceu. No entanto, houve um problema: a pessoa que deveria entregar os prontuários, atrasou. Logo, uma simples consulta, que levaria rápidos quinze minutos, levou uma hora e pouco...
Saí atrasado de lá. Mas tinha esperança de chegar a tempo na fonoaudióloga. Depois de 10 minutos no ponto, o busão chegou. O peguei me mandei. Mas, no caminho, fiz os cálculos: a consulta era 9h20, já era 9h25... Se eu chegasse às 9h55, teria de andar por cinco minutos até o consultório... Logo, 10h... A consulta termina 10h20... Esquece... Telefonei pra doutora e desmarquei... Sem muito o que fazer, resolvi aproveitar a viagem e ir até o ponto final da linha.
O ônibus que peguei para ir ao consultório era o mesmo veículo que pego pra voltar das consultas... O Apache Vip, prefixo 51423... Mesmo carro - com a tampa do painel interno na cor azul-calcinha (trash!)... Mesmo motorista... Mesma cobradora. O ponto final ficava a uns 15 minutos do ponto mais próximo ao consultório. Logo, entre a ida e a volta, o tempo não era grande... Se eu tivesse descido e feito os 20 minutos da sessão, o teria pego novamente pra voltar...
Como todo bom busólogo, logo que desci no ponto final, saquei minha máquina fotográfica da mochila. Tinha de ser rápido, pois o motorista ou o fiscal poderiam encher o saco se me vissem fotografando o veículo. Fico enrolando, procurando um ângulo legal. Atravesso a rua... Não satisfeito, volto pra calçada e coloco a câmera no bolso, esperando o melhor momento.
Enquanto isso, um senhor, baixinho, magrinho e de barba - com uma ferida embaixo do lábio -, vêm até mim. O cara, do nada, me abraça e diz: "É um assalto." Eu, aproveitando a vantagem física, dou um chega-pra-lá nele. Ele vai pra trás, rindo... Logo percebi que o sujeito estava brincando... Ele começa a falar... um monte de coisas... Quando passa o motorista de outra linha, que faz ponto final por ali, ele brinca com o cara chamando-o por um apelido. Brinca com a dona da banca, uma senhora oriental já com certa idade... E tagarelava comigo e com o mundo... E eu, pacientemente, o ouvia, esperando uma oportunidade pra tirar a foto. Ele era uma figura...
Em dado momento, passa um homem, literalmente, puxando um senhor. O Figura - o chamarei assim - cumprimenta o senhor, mas este quase não consegue estender o mão, já que o homem o puxava sem respeitar os limites dele. Logo o homem parou. Então, com muito custo o senhor estendeu a mão para o Figura. Em seguida, o homem e o senhor seguem até um banco, que fica no meio da praça. O Figura logo diz: "Aquele homem está se aproveitando daquele senhor... Ele só quer o dinheiro dele."
E, convenhamos, era o que parecia mesmo. De longe, eu notava algo esquisito na relação entre os dois. O Figura resolveu ir até onde eles estavam pra puxar um papo, tentando descobrir se sua teoria era verdadeira. Eu aproveitei a deixa e tirei a foto do 5 1423. Consegui tirar duas ainda, uma de cada lado.
O Figura voltou da sua sondagem e me disse: "Aquele homem é filho daquele senhor. Só está andando com aquele senhor pra poder pegar o dinheiro dele". Picaretagem... A olhos vistos percebe-se que o cara não tá nem aí pro pai... Filho de chocadeira...
Mas nosso amigo Figura, revoltado, vai de novo até o homem tirar satisfação. Instantes depois, o motorista e a cobradora entram pela porta de trás e liberam a da frente. Vamos começar a viagem de volta... Antes que eu subisse no ônibus, o Figura aparece dizendo: "Disse a ele que se continuasse a se aproveitar de seu pai, o denunciaria à polícia". Olhei para a praça e o homem já estava longe, arrastando o seu pai...
Eu aceno, me despedindo do Figura, o animado cidadão que não falava um português nem um pouco parecido com o que eu usei para reproduzir suas falas... Ele acenou de volta... Eu fazia meu caminho de volta e ele, com ingenuidade e inocência, seguiu seu caminho falando e marcando seu espaço na vida de outras pessoas...
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